terça-feira, agosto 11, 2009

Tereza

Ninguém conseguia perceber qual era a necessidade daquilo tudo.
Ninguém percebia se havia algum tipo de sentimento maior ou se era meramente desejo.
Os melhores amigos olhavam de lado quando ela se tentava explicar, ainda que não o pudesse fazer de uma maneira acessível.
Mas agora ela é velha. Tem 73 anos e toda a sua juventude é apenas uma memória naquele álbum de recordações chamado cérebro.
No entanto, nem agora existe alguém que perceba a necessidade daquilo tudo.
Ela ainda hoje se ri quando menciona o caso, mesmo que nem todos os dentes sejam verdadeiros.
Explica-o através de uma palavra. Narcisismo.
Era tudo para ela. Era tudo dela.
Como quando somos pequenos e imaginamos que a nossa vida é um filme de cinema. Romantizamos tudo e acreditamos vivamente que temos uma casa na arvore, que nao verdade é uma caixa na varanda.
Assim para ela, ele não passava de um objecto. Ou talvez um sonho. Algo que existia apenas no seu imaginário e vinha ao de cima escassas vezes. Apenas no escuro da noite. Apenas quando se cruzavam.
No entanto, até hoje ninguém percebeu que era apenas uma forma de masturbação, usando outra pessoa em vez de si própria. Era uma forma de narcisismo.
Era com ela própria que fazia amor e nunca com ele.
Era o seu corpo que admirava, não o dele.
O que ele via nela, nunca percebeu. Nem tampouco lhe interessou.
Mas ainda agora, com 73 anos, de vez em quando, ele aparece.
E os outros continuam a olhar de lado para esta atracção inexplicável por alguém que nem sabe reconhecer durante o dia, pois nunca olhou bem para ele.

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